sábado, 26 de fevereiro de 2011

João-Sem-Dúvidas

O João-Sem-Dúvidas era um jovem pouco letrado, com a 3ª classe antiga, mas com uma vontade desmedida de mostrar serviço. Dizia que não havia ninguém que se comparasse com ele a notar uma carta. Perdia-se de amores por qualquer uma rapariga acabada de formar (professora, advogada, enfermeira, etc.) - profissões femininas que na altura não abundavam na aldeia. Assim nenhuma recém-licenciada escapava à sua prosa apaixonada. Apesar das respostas às suas investidas nunca acabarem por surgir, no seu imaginário existia sempre uma confiança impressionante, dando sempre a entender que estava tudo a correr às mil maravilhas. Talvez devido ao facto de ser fumador, apresentava os dentes negros e sem sinais de asseio.Questionei-o se costumava lavar os dentes e se a sua figura pouco atractiva não poderia prejudicar futuros relacionamentos. A sua resposta não tardou, totalmente desprovida de preconceito:
-Não rapaz, foi coisa que nunca lavei e, também não é preciso!!!

Tia Maria Cigarra

Figura pequena e franzina, era incontornável a sua propensão para nos dar umas secas intermináveis, sobre os mais variados temas. A tia Maria Cigarra apesar de analfabeta, surpreendia-nos imenso, pois tinha tudo memorizado e apreendido através da tradição oral e não necessitava de consultar fosse o que fosse para nos "bombardear" durante mais de uma hora com uma quantidade apreciável de cantilenas, lengalengas, orações e rezas. Um dia perguntei-lhe até que localidades ela já tinha viajado, respondendo-me de imediato que nunca tinha saído da aldeia, porque se dava muito mal nos carros e nem a Fátima, nunca tinha ido !!!
Inicio, hoje, neste espaço, um novo ciclo, alterando substancialmente o paradigma de texto que me conduziu até aqui. Dei-lhe o título de " Histórias de Aldeia" pois pretendo fazer o relato de algumas narrações burlescas e caricatas, cujo conteúdo é genuína ficção; deste modo qualquer semelhança com casos reais é pura coincidência.
Um abraço
LD